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Entrevista - Sócrates (filósofo)

Um dia na história!
 
Sócrates, distanciando-se dos primeiros filósofos e opondo-se aos sofistas, afirma que a verdade pode ser conhecida, mas primeiro devemos afastar as ilusões dos sentidos e as ilusões das palavras ou das opiniões e alcançar a verdade apenas pelo pensamento. Os sentidos nos dão as aparências das coisas, e as palavras, meras opiniões sobre elas. Conhecer é passar da aparência à essência, da opinião ao conceito de cada um dos seres e de cada um dos valores da vida moral e política.
Filho do escultor Sofronisco e da parteira Fenareta, conheceremos um pouco mais dos pensamentos e idéias de um dos mais importantes filósofos gregos.
 
PERGUNTA: Assim como seu antecessor, o sofista Protágoras, você também foi condenado à morte sob acusação de impiedade e corrupção da juventude. Protágoras morreu na fuga da condenação e você agiu com uma extraordinária aceitação. Qual foi o motivo dessa atitude contraditória?
RESPOSTA: Protágoras não acreditava nos deuses e encarava a morte como um mergulho no desconhecido, ele foi coerente ao tentar salvar o bem que possuía: a vida. Eu estou a serviço dos deuses, por isso recuso-me a perder, por uma fuga à condenação legal, o bem maior que possuo além do mundo, já que penso na morte como a partida para um nova vida.
 
P: Então podemos dizer que dessa forma sente-se livre do mundo, certo?
R: Ora, a filosofia, como amor ao saber, é exatamente a atividade que em vida, permite uma maior aproximação da verdadeira realidade, purificando o homem que se concentra cada vez mais com os olhos da alma e não com os do corpo. Assim, a filosofia é a mais nobre das atividades humanas e prepara o homem para, após a morte, ser capaz de atingir totalmente o objetivo da sua busca: a verdadeira sabedoria. Por isso, alegro-me quando enfim chega o momento de libertar-me do corpo (e não do mundo) para contemplar, sem véus nem sombras, o vale da verdade.
 
P: Sobre a sua consulta ao oráculo de Delfos, o que ouviu? Qual foi a mensagem passada?
R: Ouvi a voz do dáimon – espécie de espírito bom que personifica o caráter e destino de uma pessoa – que transmitia uma mensagem de Apolo dizendo que eu era o mais sábio entre os homens. Fiquei espantado e procurei outros homens que eu julgava mais sábios e percebi que esta sabedoria era nula entre eles, ou seja, compreendi que nenhum homem sabe verdadeiramente nada, o mais sábio é aquele que reconhece isso.
 
P: Considera esta linha de pensamento como a principal diferença entre você e os sofistas?
R: Sem dúvida. O sofista é um professor de técnicas, de política, de virtude e sabedoria, portanto, é alguém que julga ter mais conhecimentos e ser capaz de transmiti-los. Os sofistas são céticos, para eles o sim e o não dependem apenas dos argumentos para persuadir alguém, não há porque buscar a verdade, pois esta não existe. Eu não me apresento como um professor. Pergunto, não respondo. Indago, não ensino. Para mim o conhecimento não é um estado de sabedoria, mas um processo, uma busca, uma procura da verdade.
 
P: É assim que explica a sua célebre frase “Sei que nada sei” ?
R: A partir da inscrição do pórtico do templo de Apolo – “Conhece-te a ti mesmo” – comecei a praticar a filosofia como missão: a busca incessante da verdade e da sabedoria e o reconhecimento incessante de que a cada conhecimento obtido, uma nova ignorância se abre diante de nós. Isto não significa que a verdade não exista, e sim que deve ser sempre procurada e que sempre será maior que nós.
 
P: Você costuma dizer que é “parteiro de almas”. Como explica isso?
R: Quero dizer que, em primeiro lugar, não sou o pai das idéias que nascem da alma do meu interlocutor, meu papel é apenas auxiliar o nascimento de tais idéias, fazer aparecer o desejo de saber e ajudando-o a realizar sozinho esse desejo.
 
P: De onde provém a noção da verdade?
R: Vem de nós mesmos, isto é, do juízo que fazemos sobre as coisas. Se temos dificuldade para encontrá-la é porque vivemos como autômatos que obedecem cegamente a ordens externas, aceitamos passivamente os preconceitos estabelecidos. A verdade desloca-se, portanto, da contemplação exterior à contemplação interior.
 
P: O que você acha das comparações feitas entre você e Jesus? Você concorda?
R: Os pensadores cristãos sempre me compararam a Jesus por diversos motivos: ambos fomos condenados por causa de nossos ensinamentos, e nenhum de nós se defendeu no julgamento. Nenhum de nós dois deixou algo escrito, mas mesmo assim tivemos varias seguidores. Porém não concordo em ser comparado a Jesus, pois eu, ao contrário dele, não profetizava e nem passava nenhuma mensagem divina.
 
P: O que você tem a falar sobre virtude?
R: Não se consegue definir uma virtude, sem antes definir sua essência. A virtude é uma totalidade que deve estar presente em todas suas partes. Ela não pode ser ensinada, pois não é uma convenção nem uma técnica. Virtude é algo que já nascemos inclinados por natureza.  A virtude é uma forma de conhecimento, a mais alta de todas, e não simplesmente um modo de agir. Poderia ficar horas falando sobre virtude!
 
P: Realmente, é um assunto muito grande, mas você já disse o suficiente. Agora, qual foi o seu ensinamento mais importante?
R: Sempre ensinei que todos os homens são iguais, pois todos são capazes da ciência, todos também são capazes da virtude. Razão, ciência, verdade e virtude são universais, e todos os homens, sem nenhuma exceção, são capazes delas.
 
P: Para você, a alma é muito importante. Qual sua visão sobre a alma?
R: Para mim, a alma é algo totalmente diferente do corpo, é uma consciência de si, do bem e do mal, da justiça e da virtude. É a inteligência que reflete e interroga sobre a verdade e a realidade das coisas. Um poder intelectual para descobrir em si mesma a verdade das coisas, e dar para si mesma as regras de uma vida virtuosa.
 
P: É notório que você nunca aceitou escravos. Por que, se naquela época era comum?
R: Como já disse anteriormente, para mim todos os homens são iguais, aptos à sabedoria. Também sempre considerei o ócio como uma das melhores coisas que o homem pode ter, pois lhe proporciona sabedoria. Se eu aceitasse escravos, me tornaria um espoliador. E meu crime seria gigantesco, pois estaria roubando de alguém o melhor de todos os bens, que é a sabedoria, para mante-lo no maior de todos os males, que é a ignorância.
 
P: Para você, o que sempre importou foi o homem. Por quê?
R: Era comum aos filósofos anteriores a mim, estudar a natureza. Mas para mim não, sempre achei que o que realmente importa é o homem. Nisso eu concordo com os sofistas. Mas para os sofistas o importante eram suas ambições. Já para mim o que importa são suas idéias, já que o homem não vice como os animais, impulsionado pelas necessidades orgânicas, mas sim guiado pelas idéias.
 
P: Você se considera um homem do povo?
R: Sempre gostei de conversar com todos os homens, sem distinção. Pertencia a classe média, mantinha relações com altas personalidades, fazia parte de rodas intelectuais, mas mesmo assim sempre conversei com o povo, artesões e trabalhadores comuns.
 
P: É verdade que você só saiu de Atenas três vezes?
R: Sim. Sempre gostei de Atenas. As únicas três vezes que sai de lá, foram como cidadão-soldado, participando de três campanhas da guerra do Peloponeso. Sempre cumpri a lei.
 
P: Para finalizar, qual conselho você da para a geração atual?
R: Pensar. É isso que está faltando. Atualmente as pessoas tem preguiça de raciocinar, e com isso perdem o maior bem que poderiam possuir, a sabedoria. Apesar de não haver tempo, existir o estresse, tudo já vem mastigado, as pessoas deveriam possuir um pensamento crítico, que é a base da filosofia, só assim para poder mudar a situação de todos. Como eu sempre disse “conheça-te a ti mesmo”, sempre tem que haver um processo, uma busca, uma procura pela verdade. A busca incessante pelo conhecimento, pois cada vez que aprendemos algo, descobrimos o quão ignorantes somos. Nunca devemos parar de estudar e descobrir a verdade. Devemos estar sempre perguntando “o que”. Pensar é a base de tudo.
Entrevista - Sócrates (filósofo)
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Entrevista - Sócrates (filósofo)

Entrevista com o filósofo Sócrates usando como base o livro abaixo. CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia. 3. ed. São Paulo: Bras Read More

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